Nascimento de um neter crocodilo
Tradução de um Dua (reza) a Sobek, o neter das águas primordias, filho de Neith
Em que Nit fala do surgimento do seu filho Sobek
Eles sempre quiseram saber o nome dele, aquele que gerou meu filho. Eles falam de Set, de seu filho crocodilo, demônios do Duat, ou mesmo de um "deus" estrangeiro estranho do outro lado do mar, mas estão todos errados. Mesmo agora, quando os templos permanecem em ruínas e os sacerdotes não mais cantam louvores para nós, eles ainda perguntam e pesquisam por que não entendem.
Eles nunca o encontrarão porque ele não existe para ser encontrado. "Eu sou o pai de Sobek, e essa é a verdade que lhe digo agora."
Assumir que um neter nasce da união de homens e mulheres é entender mal a natureza da criação divina. Os neteru podem nascer do que quiserem. Nasci no meio da criação, uma fusão de luz solar e águas primordiais. Sou tudo e nada, e fico do lado de fora olhando, vendo você tentar entender.
Fui eu quem nasceu o mundo. Naquele momento, eu não precisava de pai e não precisava de Sobek. Tudo está contido em mim e forjo a criação do cosmos com minhas próprias mãos.
Eu forjei Sobek do fogo e da água, do ar e da terra, de tudo o que me cercava. Eu respirei vida em suas narinas, abri sua boca, falei seu nome.
Ele é uma criatura de fogo e água como eu, de terra e ar e poeira estelar. Ele é tudo como eu sou tudo.
Vivemos longe da corte de Rá. Vivemos nas zonas fronteiriças, nos oásis, nos estranhos e tranquilos leitos dos rios e nos vales escondidos à vista de todos. Em reclusão, dei à luz Sobek, na margem de um rio sob uma árvore grande e sombria. O rio correu para as brumas, para um lugar que eu nunca vi.
As águas rasas estavam frias, e eu assisti Sobek nadando ao redor, como se ele estivesse lá há séculos. Ele é da água mais do que eu. Ele não é tão feliz quando está longe disso.
Eu mantive a presença dele em segredo do mundo até ele crescer. Eu não chamei as Duas Senhoras. Eu o escondi nas sombras. Quando chegasse a hora, eu o traria para o mundo.
Ele gostava demais do rio para sair, de qualquer maneira. Eu o ensinava todos os dias e passava a tarde vendo-o brincar no rio. Muito rapidamente, ele sabia disso intimamente, até ousando se aventurar na beira da névoa.
Ele me perguntava o que havia além disso, e eu dizia a ele que não sabia. Eu tentei uma vez penetrar em seus mistérios, mas isso não me deixou passar.
Eu me perguntava quanto tempo levaria antes que ele nadasse e descobrisse seus mistérios por si mesmo. Eu sabia que ele iria um dia, enquanto ele continuava nadando rio abaixo até a beira das brumas. Eles estavam chamando por ele, e um dia, ele respondeu, e ele deixou meus braços, longe em um lugar que eu não podia seguir.
Nós dois éramos muito mais velhos quando ele voltou. Ele tinha a profunda sabedoria de Djehuty em seus olhos, e eu podia dizer que ele não era mais criança.
Ele nunca me disse para onde foi, e eu nunca perguntei. Mas ele voltou com fogo estelar na barriga, e eu o observei enquanto seu corpo grande se movia sem esforço através da névoa e no rio, silencioso e calmo.
Ele não era mais meu e eu não o via muito mais. Era a hora de sair para o mundo.
Eles ainda perguntariam quem era seu pai. Eles acham que estou guardando segredos e assumem que meu silêncio é proteger o envolvido. Eles acham que tenho vergonha, que o concebi com pouco cuidado ou atenção, levando um deus estrangeiro de crocodilo para a cama, mas é tudo mentira.
Sobek é o filho de Neith. Sou pai e mãe dele, criadora e tecelão do destino.
Tudo o que existe existe dentro de mim e tudo o que é forçado a Sobek. Ele é meu sozinho, nascido de tudo o que é, forjado pelas mãos da própria Neith, a Grande Ele/Ela, Mãe de mães e Pai de pais, de quem o mundo inteiro emergiu em glória.
Neith é o nome que você está procurando, mesmo que não consiga entender o porquê.
Fonte: Per-sebek, myths and stories, birth of a crocodile god
Traduzido por Leandro Franco